Dia 1 no remoto


Acordar uma hora mais tarde, quando o sol já está surgindo, faz uma enorme diferença. Psicológica talvez? Não sei. Mas faz.

Enquanto minha filha se arrumava para a escola, eu preparei o seu café-da-manhã.

Nas últimas semanas, avaliando a comida que ficava na geladeira, eu vinha percebendo que ela não estava comendo direito, nem de manhã, nem no almoço. Eu não estava aqui para acompanhar e, pelo jeito, não estava sendo suficiente apenas eu pedir que ela se alimentasse melhor. 

Mas, a partir de agora, será tudo diferente: estou presente e eu mesma posso garantir a quantidade adequada de proteína naquele pão.  

Sentamos juntas à mesa para tomar café. Nesse horário, geralmente, eu já tinha saído de casa para o trabalho. O ar fresquinho que entrava pela janela acompanhava a nossa conversa sobre os sonhos que tivemos à noite e os planos para o dia. 

Na hora de sair, como era de costume durante o trabalho remoto emergencial, eu lhe dei um beijo e fiquei esperando com a porta do apartamento aberta até o elevador chegar e eu lhe desejar "boa aula". Na minha cabeça, isso é bem diferente do que ela sair sozinha de casa, trancar a porta e não ter ninguém lá para se despedir. Afinal, ela ainda tem só 14 anos.

Ao registrar minha entrada no ponto, senti novamente a alegria de poder clicar no "sim" respondendo à pergunta se estava trabalhando remoto hoje. Antigamente, era essa felicidade que eu sentia, junto de uma enorme gratidão. Eu sempre acrescentava em meus pensamentos um "Graças a Deus" depois de clicar na resposta. Mas, desde que a empresa começou a convocar os funcionários para voltar ao presencial no ano passado, mesmo que eu ainda estivesse em casa por fazer parte do grupo de risco para complicações da covid-19, aquela pergunta deixou de ser uma benção e passou a ser uma ameaça. Então foi muito bom voltar a sentir um quentinho no coração ao clicar na bolinha do sim. Sorri e suspirei. Alívio, alegria, gratidão, tudo misturado.

Eu estava até com saudades da minha empregada, pois mal nos víamos ultimamente. Pudemos conversar sobre estratégias de cardápio para tentar melhorar a alimentação da filhota no almoço. Ela tinha reparado o mesmo que eu, sobre ela não estar comendo direito. 

Usei a estratégia de uma amiga de optar por tirar 30 minutos de almoço, ao invés de comer nos rápidos 15 minutos de intervalo, que, sendo bem honesta, eu raramente tirava. Aguardei minha filha chegar da escola e pudemos comer juntas, enquanto eu ouvia as histórias do dia e pude consolá-la por algumas tristezas. 

Outra nova estratégia adotada foi continuar me arrumando para trabalhar. Não como se estivesse indo para o escritório, pois em casa posso optar por um look mais confortável, menos maquiagem e pés descalços. Mas a meta é, se precisar abrir a câmera, as pessoas reconhecerão a mesma mulher que encontram presencialmente. E qual a métrica de acompanhamento? A foto do look no espelho, claro - não mais no banheiro da firma, mas agora na sala da minha casa.

Minhas estratégias para o trabalho remoto serão tema de outro post. Diferente da vez anterior, agora foi possível planejar e tomar como base os erros e acertos da experiência passada de mais de um ano e meio de trabalho remoto emergencial.

Por agora só queria registrar que começou essa minha nova fase de trabalho, que tem previsão de durar 12 meses. A principal sensação é de ter sido tirado um enorme peso das minhas costas. 

Me sinto feliz e reconhecida. Respiro. E percebo na prática como é bom se livrar daquela ansiedade de se ver correndo o tempo todo, de estar sempre em cima da hora, de estar sempre em falta. 

Ana presente. 


Imagem de StockSnap disponível para download no Pixabay. 

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